quarta-feira, 19 de março de 2014

Música Clássica Contemporânea – o que é e porque as pessoas não gostam tanto assim?


Inicio a conversa de hoje respondendo uma pergunta que foi feita depois do último texto e eu, por absoluta incompetência tecnológica, não consegui responder no local adequado. A pergunta foi: “Li em um livro de David Tame o seguinte comentário de Vaughan Williams: "...não acredito que se escreva a grande música quebrando a tradição, senão acrescentando-a ". Você concorda? O problema dessa afirmação está, ao meu ver, na terminologia. O que seria “quebrar” a tradição e o que seria “acrescentar”?

Se eu penso na música do século XX, momento em que houve o afastamento maior das plateias, não vejo rupturas. Vejo acréscimos. Da mesma forma que vejo Wagner, Beethoven, Bach, para citar alguns, acrescentando, e não rompendo. E todos eles receberam duras críticas em suas épocas, por estarem escrevendo uma música que teria mudanças radicais em demasia.  Uma grande diferença, ao meu ver, é a velocidade da transformação, que a partir do final do século XIX foi avassaladora

Outra questão fundamental é a do financiamento. Explico: na minha humilde opinião, temos sempre duas forças concorrentes: o gosto pelo novo X a satisfação do conhecido. Ou estímulo X acomodação. Todos temos um pouco dos dois, em proporções diferentes. O novo traz consigo a ideia de “exclusivo”. Ou seja, aquilo que antes ninguém teve acesso. Até meados do século XIX tínhamos como mecenas, como financiadores da arte, a nobreza e o alto clero. Eles, além de sua educação requintada, tinham gosto pelo exclusivo. Imaginem que fantástico: contratar um compositor para compor uma música inteiramente nova, nunca antes ouvida!

Nesse caminho que Bach, por exemplo, tinha como parte de suas obrigações compor um novo oratório a cada semana para o serviço da Igreja. Ou seja, aqueles que financiavam a música estavam dispostos a doses grandes de mudança e novidades. Mesmo que houvesse críticas às mudanças mais radicais, elas eram toleradas e a música ia avançando. A partir da Revolução Industrial, os donos do dinheiro e, consequentemente, quem tinha condições de financiar a música, passou a ser a burguesia. Menos educados (mas não mal-educados), estes preferem o conforto do conhecido ao risco do novo. É aquela sensação que temos ao ir a um show do nosso cantor popular preferido. Por mais que ele esteja animado em mostrar suas novas canções, o que queremos mesmo é que ele toque os sucessos antigos.


Agora, imaginem essa sensação quando as novas músicas vão também modificando a estrutura, com mudanças grandes e rápidas (antes que você absorva uma mudança, já tem outra acontecendo ). Esse novo ouvinte, tendo outra opção, acaba desistindo do novo. É como você escolher entre ir ao show do tal cantor em que ele toque só sucessos ou em outro, dele mesmo, em que ele toque apenas músicas inéditas. Agravado pelo fato desse inédito conter mudanças grandes na sua estrutura. Por não ter o hábito, por preguiça de experimentar, por não se sentir seduzido a continuar tentando, desistimos. Por isso que acredito que o caminho para a Música Contemporânea é o da “sedução” do ouvinte. Criar estímulos para que o ouvinte insista um pouco mais. Como eu costumo dizer, ninguém gosta de peixe cru da primeira vez que come.  Acha sem graça, sem gosto, esquisito. O paladar não “entende”. Mas os amigos insistem, comemos uma segunda vez, terceira, e, quando percebemos, passamos a adorar! Insistam com a música contemporânea. Garanto que, depois de um tempo, vocês não vão querer outra coisa!

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