Inicio a
conversa de hoje respondendo uma pergunta que foi feita depois do último texto
e eu, por absoluta incompetência tecnológica, não consegui responder no local
adequado. A pergunta foi: “Li em um livro de David Tame o seguinte comentário
de Vaughan Williams: "...não acredito que se escreva a grande música
quebrando a tradição, senão acrescentando-a ". Você concorda? O problema
dessa afirmação está, ao meu ver, na terminologia. O que seria “quebrar” a
tradição e o que seria “acrescentar”?
Se eu penso
na música do século XX, momento em que houve o afastamento maior das plateias,
não vejo rupturas. Vejo acréscimos. Da mesma forma que vejo Wagner, Beethoven,
Bach, para citar alguns, acrescentando, e não rompendo. E todos eles receberam
duras críticas em suas épocas, por estarem escrevendo uma música que teria
mudanças radicais em demasia. Uma grande
diferença, ao meu ver, é a velocidade da transformação, que a partir do final
do século XIX foi avassaladora
Outra
questão fundamental é a do financiamento. Explico: na minha humilde opinião,
temos sempre duas forças concorrentes: o gosto pelo novo X a satisfação do
conhecido. Ou estímulo X acomodação. Todos temos um pouco dos dois, em
proporções diferentes. O novo traz consigo a ideia de “exclusivo”. Ou seja,
aquilo que antes ninguém teve acesso. Até meados do século XIX tínhamos como
mecenas, como financiadores da arte, a nobreza e o alto clero. Eles, além de
sua educação requintada, tinham gosto pelo exclusivo. Imaginem que fantástico:
contratar um compositor para compor uma música inteiramente nova, nunca antes
ouvida!
Nesse
caminho que Bach, por exemplo, tinha como parte de suas obrigações compor um
novo oratório a cada semana para o serviço da Igreja. Ou seja, aqueles que
financiavam a música estavam dispostos a doses grandes de mudança e novidades.
Mesmo que houvesse críticas às mudanças mais radicais, elas eram toleradas e a
música ia avançando. A partir da Revolução Industrial, os donos do dinheiro e,
consequentemente, quem tinha condições de financiar a música, passou a ser a
burguesia. Menos educados (mas não mal-educados), estes preferem o conforto do
conhecido ao risco do novo. É aquela sensação que temos ao ir a um show do
nosso cantor popular preferido. Por mais que ele esteja animado em mostrar suas
novas canções, o que queremos mesmo é que ele toque os sucessos antigos.
Agora,
imaginem essa sensação quando as novas músicas vão também modificando a
estrutura, com mudanças grandes e rápidas (antes que você absorva uma mudança,
já tem outra acontecendo ). Esse novo ouvinte, tendo outra opção, acaba
desistindo do novo. É como você escolher entre ir ao show do tal cantor em que
ele toque só sucessos ou em outro, dele mesmo, em que ele toque apenas músicas
inéditas. Agravado pelo fato desse inédito conter mudanças grandes na sua
estrutura. Por não ter o hábito, por preguiça de experimentar, por não se
sentir seduzido a continuar tentando, desistimos. Por isso que acredito que o
caminho para a Música Contemporânea é o da “sedução” do ouvinte. Criar estímulos
para que o ouvinte insista um pouco mais. Como eu costumo dizer, ninguém gosta
de peixe cru da primeira vez que come.
Acha sem graça, sem gosto, esquisito. O paladar não “entende”. Mas os
amigos insistem, comemos uma segunda vez, terceira, e, quando percebemos,
passamos a adorar! Insistam com a música contemporânea. Garanto que, depois de
um tempo, vocês não vão querer outra coisa!
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