O violoncelista pernambucano Antonio Meneses, de 54 anos,
está em São Paulo para três concertos com a Orquestra Sinfônica do Estado de
São Paulo (Osesp), de quinta a sábado na Sala São Paulo (onde sola o concerto
de Dvorák regido pela primeira vez por Marin Alsop) e hoje, para um concerto de
câmara com obras de Villa-Lobos, Shostakovich e César Franck ao lado do
pianista José Feghali.
Feliz, anuncia ao
Valor que já gravou, em janeiro, "o primeiro CD da minha parceria com a
pianista portuguesa Maria João Pires, radicada no Brasil, que será lançado ano
que vem pela Deutsche Grammophon, com obras de Schubert, Brahms, Mendelssohn e
Bach". Meneses deve comemorar mesmo, pois fecha um círculo virtuosíssimo.
Depois de 30 anos,
volta a lançar um CD pela Deutsche Grammophon, a mais ilustre das gravadoras
clássicas, que possui o famoso selo amarelo em todas as suas capas. É que, em
1982, ele estreou na DG, como os insiders a chamam, já no topo: gravou o
concerto duplo de Brahms ao lado da violinista Anne-Sophie Mutter e a
Filarmônica de Berlim, regida por Herbert Von Karajan. Isso aconteceu logo após
ter vencido contra todas as probabilidades uma penca de russos (e dezenas de
outros violoncelistas do mundo inteiro) no Concurso Internacional Tchaikovsky
de Moscou - o mais importante concurso musical do planeta.
Meneses confessou,
ainda em 1982, que não se sentira à vontade com a interpretação de Karajan. Sua
timidez bem pode ter sido o motivo de não ter deslanchado logo em seguida na
carreira internacional, mesmo com o prêmio musical mais cobiçado no mundo em
sua bagagem.
Quem o conhece bem sabe que nada o abala. Ele continua calmo
e introspectivo. E nestes últimos 30 anos construiu com paciência uma carreira
sólida e notável. Galgou degraus consistentes. Registrou sua visão pessoal da
"bíblia" do instrumento, as seis suítes para violoncelo solo de Bach
nos anos 1980, no Japão; e, já no século XXI, revisitou-as de modo definitivo,
em deslumbrante e amadurecida interpretação (disponível em álbum duplo nacional
do selo Clássicos). Associou-se à última formação do lendário Beaux Arts Trio,
que durante meio século foi liderado pelo maravilhoso pianista Menahem
Pressler. Gravou vários CDs com o trio para a Philips. Mas tem preferência
clara pela integral das sonatas para violoncelo e piano de Beethoven que registrou
com Pressler já octogenário (também disponíveis em álbum duplo nacional).
Ele encerrou semana retrasada em Paris uma turnê com a
Orquestra Nacional da França sob regência de Daniele Gatti em várias cidades
suíças (Zurique, Berna, Lucerna e Genebra). "Depois do Brasil, irei tocar
e dar masterclasses pela primeira vez em Taiwan e em seguida realizarei uma
turnê no Japão" - onde tem imenso prestígio. Meneses deu esta entrevista
ainda antes de desembarcar em São Paulo, o que aconteceu no sábado dia 7. A seguir,
os principais trechos:
Valor: Como está seu ritmo de concertos e gravações nesta
temporada 2012?
Antonio Meneses: Tenho dois CDs novos no forno, um que sai
agora em maio e outro no ano que vem. O primeiro é um CD com dois concertos: o
primeiro é arquiconhecido, do inglês Edward Elgar [1857-1934], mas meu
entusiasmo maior é por um concerto inédito, primeiríssima gravação mundial, do
austríaco Hans Gal [1890-1987]. É um compositor de origem judaica que só está
sendo redescoberto agora. Sua obra é de primeira grandeza, muito romântica e de
incrível beleza. A orquestra será a Northern Sinfonia, com a qual gravei também
os dois concertos de Haydn e o do pernambucano Clóvis Pereira, e o regente é o
nosso querido Claudio Cruz [spalla da Osesp], que fez um magnífico trabalho.
Sairá pela Avie no mercado internacional e pelo selo Clássicos no Brasil. Foi
gravado em janeiro passado.
Valor: O segundo CD deve ter significado especial para
você...
Meneses: Sim. Têm sido muito importantes os recitais na
Europa com Maria João Pires, momentos mágicos dessa temporada. Este CD, também
gravado em janeiro, é o primeiro da minha parceria com ela.
Valor: Você passa duas semanas inteiras com a Osesp neste
ano. Além dos concertos desta semana, você retorna em novembro, e está sendo
anunciado como "artista em residência da Osesp".
Meneses: Os concertos com a Osesp são três, além do recital
com o Feghali. Existe muito mais o conceito de compositor em residência. O de
artista/solista é algo novo para mim, mas não deixa de ser interessante, pela
diversidade da programação, já que tocarei obras conhecidas, como o concerto de
Dvorák, e uma inédita, como o concerto do Marco Padilha em novembro. Isso tudo
além da música de câmara em forma de recital. Uma coisa que me agrada é tocar o
segundo violoncelo do maravilhoso Quinteto de Schubert.
Valor: Como nasceu o teu interesse na obra do compositor
campineiro Marco Padilha?
Meneses: Nos últimos anos tenho me voltado muito para a
música brasileira. O concerto do Padilha foi terminado já há uns três ou quatro
anos e passou por diversas etapas de criação. É uma obra em um movimento
contínuo com acompanhamento de uma orquestra grande. É tecnicamente bastante
difícil, e por culpa minha, pois uma versão anterior me pareceu fácil demais e
por isso pedi ao compositor que explorasse melhor as possibilidades do
instrumento. Exige muito do solista.
Valor: Você já tocou com José Feghali antes ou esta
apresentação da terça será a estreia de um novo duo? E com a nova titular da
Osesp, também será a primeira vez?
Meneses: Em princípio, este será o meu primeiro recital com
o Feghali. Ainda quando garotos, tocamos uma vez no Rio de Janeiro uma sonata
de Beethoven, mas acho que ele mesmo concordaria que esse não valeu. O de São
Paulo, portanto, será nosso "début". Também será minha primeira vez
com Marin Alsop. Só a conheço de nome e pela ótima reputação que tem. Estou
realmente feliz com essa parceria e tenho certeza de que será uma ótima
experiência para mim.
Valor: O que te agrada mais hoje: ser solista com orquestra
ou fazer música de câmara?
Meneses: Gosto das duas coisas, mas o que mais importa é a
qualidade musical e artística da parceria, tanto no caso de concertos com
orquestra como na música de câmara. Confesso que já participei, por exemplo, de
concertos de música de câmara que me deixaram muito infelizes, pela falta de
ensaios e de vontade de todos os participantes para se atingir o máximo
possível de expressão musical. No reino das orquestras, acontece muito de
regentes deixarem só aquela última meia horinha do ensaio para trabalhar a obra
com o solista, o que demonstra descaso para com a música em geral. É impossível
atingir assim um nível musical e técnico mais alto!
Antonio Meneses e José Feghali
Série de Câmara
Sala São Paulo
praça Júlio Prestes,
16, SP, tel. (11) 3223-3966
R$ 54 a R$ 62
Marin Alsop rege Bernstein - Antonio Meneses (artista em
residência)Sala São Paulo;
qui. (dia 12) e sex. (dia 13), às 21h; sáb. (dia 14), às
16h30.
R$ 26 a R$ 149
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