terça-feira, 9 de abril de 2013

"Teatro Bolshoi está virando um grande prostíbulo", diz bailarina


Ataque ao diretor artístico ocorrido em janeiro é apenas a ponta do iceberg de uma rede de intrigas
Intriga, inveja, sexo e dinheiro – estes são os possíveis ingredientes do episódio envolvendo o Teatro Bolshoi de Moscou, o mais importante palco de balé do mundo, no início deste ano. No dia 17 de janeiro, uma pessoa mascarada jogou ácido sulfúrico no rosto do diretor artístico do teatro, Sergei Filin, e as razões podem ter sido profissionais.
Em entrevista exclusiva ao Opera Mundi, a ex-primeira bailarina do Bolshoi, Anastasia Volochkova, falou sobre o clima de disputa dentro do teatro. Anastasia foi demitida do Bolshoi em 2003, oficialmente por estar acima do peso e por ser muito alta. Ela desmente e revela sem medo de sofrer (mais) represálias todos os problemas internos com a administração do teatro.

"Resolvi processar Anatoly Iksanov (diretor-geral do Bolshoi) e consegui provar na justiça que ele estava errado em me demitir. Durante o processo, dois homens vieram me trazer um buquê de flores depois de uma apresentação em Kiev (Ucrânia), mas entre as flores havia uma faca. Você consegue imaginar isso? Uma ameaça vinda do diretor-geral do Bolshoi”.
Anastasia diz ainda que todos os seus parceiros de dança foram ameaçados e agredidos na rua. "Evgeny Ivanchenko, que dançava comigo, foi ameaçado na porta de casa. Disseram que se ele se aproximasse de mim, seria morto”.

Ela relata um episódio em que estava dançando o primeiro ato do Lago dos Cisnes e quando voltou para o camarim, viu que alguém havia tirado toda a purpurina do figurino que ela usaria no segundo ato. "Eu nunca descobri quem fez isso. Foram tantos problemas. No Bolshoi, se você tem um papel de destaque, tudo pode acontecer. Já colocaram até vidro dentro da minha sapatilha. Os bailarinos e bailarinas são capazes de tudo. Há até mesmo uma máfia de aplausos, grupos de pessoas que são contratados para aplaudir seus clientes".
A bailarina cita o recente caso de Svetlana Lunkina, que recebeu ameaças durante seis meses por causa da posição de primeira bailarina do Bolshoi. "As ameaças foram encomendadas por uma bailarina com muito menos talento, mas que tem um pai rico", conta Anastasia. Por motivo de segurança, Lunkina decidiu estender sua estadia no Canadá, onde passava uma temporada.

O envolvimento dos oligarcas russos com a instituição também não é poupado durante a conversa. Segundo a bailarina, qualquer pessoa com muito dinheiro pode chegar à administração e dizer quem vai dançar no teatro. Anastasia lamenta que interesses políticos e comerciais sejam mais importantes no Bolshoi do que talento, já que "isso destrói a atmosfera de arte" do lugar.
 “Eu fui despedida, mas continuei em contato com as meninas (bailarinas). E elas me contaram
que alguns oligarcas fizeram festas particulares no Palácio de Buckingham, em Londres, com a ajuda de Iksanov e Mikhail Shvydkoy (ex-ministro de Cultura da Rússia). Imagine o dinheiro gasto. Além disso, eles forçavam as meninas a participar destas festas e avisavam que durante os encontros com os oligarcas, haveria bebida e sexo...".

Anastasia afirma que a administração do Bolshoi faz chantagens para que as bailarinas participem das festas, dizendo que elas podem vir a ter problemas com o teatro e até mesmo ser tiradas de importantes turnês internacionais. “Agora qualquer oligarca pode vir e escolher uma menina no teatro. Ela não tem opção. O Bolshoi está virando um grande prostíbulo”.
A ex-bailarina do Bolshoi conta que durante alguns anos chegou a ser membro do partido Rússia Unida (governista, que apoia o presidente Vladimir Putin), mas diz que agora não apoia nenhum político na Rússia. Apesar disso, revela com certo pessimismo que somente o Kremlin pode resolver os problemas internos do teatro.

 “Não sei o que mais precisa acontecer no teatro para que o governo russo faça algo”. E conclui: “É claro que há muita inveja e competição em outros teatros, mas acho as questões internas e políticas do Bolshoi fazem do teatro um local com um clima muito mais pesado. O Bolshoi é um espelho de tudo o que está acontecendo nosso país, mas em miniatura”.
Ataque não é situação isolada

A briga por papeis e as intrigas nos bastidores do Bolshoi não são novidade no teatro. Em 2011, o então diretor, Gennady Yanin, pediu demissão depois de que fotos pornográficas alegadamente suas em atos homossexuais fossem enviadas por e-mail aos artistas do balé e a outros 3.847 destinatários. Em seguida, as fotos foram publicadas na Internet. A mídia russa especulou na época que colegas de Yanin teriam conspirado contra ele para forçar sua saída.
Em janeiro de 2009, seu antecessor, Alexei Ratmansky, deixou o Bolshoi dizendo que "esse teatro não tem moral".

As polêmicas não param por aí. O palco histórico do teatro Bolshoi reabriu em outubro de 2011 depois de um atraso de três anos nas obras de reforma (foram seis anos fechado), escândalos de corrupção (os gastos chegaram a 2 bilhões de reais) e muitas críticas dos bailarinos, devido às más condições dos camarins e salas de ensaio.
Na mesma semana em que foi atacado na capital russa, Filin teve os pneus do seu carro furados. E no início de janeiro, hackers publicaram nas redes sociais correspondências pessoais do diretor.

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