Villa-Lobos(1887-1959), nosso maior compositor, é reconhecido
mundialmente por suas Bachianas, por seus Choros, por suas obras para violão solo e por algumas
obras para piano. Normalmente os europeus e americanos percebem a existência de Villa-Lobos quando
este utiliza material folclórico, quando ele soa exótico, e como suas sinfonias
são em geral obras pouco nacionalistas elas acabam impressionando pouco o
público estrangeiro. Lembro-me de conversas que tive com dois músicos que
conheceram Villa-Lobos, o compositorCamargo Guarnieri (1907-1993)
e a pianistaAnna Stella Schic (1925-2008), e ambos defendiam que Villa-Lobos era
um genial compositor de miniaturas musicais, não de grandes obras. Anna Stella,
que foi a primeira pianista a gravar a integral da obra pianística do
compositor, revelou para mim o seu desagrado em relação ao Rudepoema (a mais longa obra para piano de Villa-Lobos),
obra que ela só tocou na citada gravação, e se referia a suas sinfonias como
“monstrengos”.
Desde o
ano passado o selo Naxos está
lançando uma nova integral das Sinfonias de Villa-Lobos, a primeira
integral gravada no Brasil, já que houve uma lançada pelo selo CPO com a Orquestra da Rádio de Stuttgart regida
por Carl Saint Clair. A integral da naxos conta com a participação
da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP) regida
porIssak Karabtchevsky. Acaba de ser lançado o segundo CD desta
integral. No ano passado saíram as Sinfonias de números 6 e 7 , e agora saíram
as duas sinfonias focadas na primeira guerra mundial: a de Nº 3 , chamada “A guerra” e a de Nº 4 , chamada “A vitória”. Não há dúvida da superioridade desta nova
gravação não só pelo excelente trabalho de revisão das partituras, como pela
própria execução musical. A tomada de som, se bem que um pouco opaca, é também
superior à da gravação alemã. Registro aqui a minha revolta pelo desprezo das
publicações estrangeiras especializadas em música clássica a respeito deste
importante lançamento. A BBC Music dedicou ao lançamento do ano passado um
brevíssimo comentário de 5 ou 6 linhas, e a outras revistas européias nem
citaram nada.
As
sinfonias de Villa-Lobos foram escritas em duas fases da vida
do compositor, sendo que as quatro primeiras foram escritas de 1916 até 1919.
Depois de um quarto de século Villa-Lobosescreveu suas outras 7
sinfonias, de 1944 a
1957. As duas sinfonias incluídas no último CD lançado pela Naxos são obras de
circunstância, e fazem, como já disse, referência à primeira guerra mundial. O
plano do compositor era escrever três sinfonias: “A guerra”, “A vitória” e “A paz”. Esta última não existe, apesar de ser
numerada. Outro mistério de Villa-Lobos. Esta sinfonia foi escrita
e perdida, ou ficou apenas nos planos do autor? De qualquer maneira a próxima
sinfonia, escrita em 1944 foi numerada como sexta. As Sinfonias de Villa-Lobos,
assim como seus Quartetos de Cordas, seguem em geral o esquema clássico de
quatro movimentos, sendo que ele alterna a oposição do scherzo entre o segundo
e o terceiro movimento. A Sinfonia Nº 3 “A guerra” impressiona pelo
experimentalismo do quarto movimento. Apesar da pequena participação do Brasil
no conflito, o autor faz uma colagem dos hinos do Brasil e da França que chega
a lembrar das experiências de colagem do americano Charles Ives (1874-1954).
O estilo é muito próximo da música francesa(escalas de tons inteiros, acordes
paralelos), e a orquestração impressionante, nos lembra a de grandes autores
russos. Seus movimentos possuem títulos descritivos: “Vida e
trabalho","Intrigas e rumores”, “Sofrimento” e “A batalha”.
A
Sinfonia Nº 4 “A vitória”, que, aliás, foi gravada sob a regência do
próprio autor, é uma obra menos extravagante, e musicalmente mais coerente. Há
uma breve citação da “Marselhesa” no
segundo movimento, e a orquestra requisitada é enorme, com requintas e
saxofones.
Se as
Sinfonias de Villa-Lobos não concorrem com a genialidade de
outras obras do autor, elas estão longe de serem obras que merecem ser
desprezadas, sobretudo pelo maravilhoso trabalho de orquestração. Lembramos
mais uma vez o elogio que o grande compositor francês Olivier Messiaen (1908-1992)
citando o compositor brasileiro como o melhor orquestrador de sua época.
Gostaria de terminar este comentário elogiando os comentários dos Cds,
excelentes ensaios do violonista Fábio Zanon. Ele demonstra em seus
textos uma erudição raras vezes vista entre nós, e suas informações formam uma
excelente fonte de pesquisa. Por enquanto este CD pode ser adquirido por
download na iTunes store por U$7,99.
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