Maestro Tugan Sokhiev fala sobre os espetáculos que serão
realizados hoje e amanhã na cidade
A certa altura, o piano deixou de ser suficiente para Tugan
Sokhiev. E, aos 15 anos, ele tomou uma decisão - seria maestro. "A riqueza
sonora da orquestra me fascinou de tal forma que me limitar a um só instrumento
parecia pouco", conta. Nascido na Ossétia do Norte, ele, hoje com 33 anos,
é um dos mais celebrados regentes da nova geração. Desde 2005, está à frente da
Orquestra Nacional do Capitólio de Toulouse, com quem se apresenta hoje e
amanhã na Sala São Paulo, pela temporada da Sociedade de Cultura Artística; e,
em setembro, assume o posto de diretor artístico e regente titular da Sinfônica
Alemã de Berlim que, coincidentemente, também está no Brasil, fazendo concertos
na Sala São Paulo, sob a regência de Vladimir Ashkenazy. Hoje, Sokhiev rege
Debussy (L'Après-midi d'Un Faune), Ravel (Concerto em Sol, com solos de Bertrand
Chamayou) e Berlioz (Sinfonia Fantástica); amanhã, interpreta Mussorgsky
(Abertura de Kovantchina e Quadros de Uma Exposição) e Listz (Concerto n.º 1,
novamente com Chamayou). Sobre as obras e as influências em sua carreira,
Sokhiev concedeu ontem entrevista ao Estado.
O senhor rege dois programas em São Paulo, um de música
francesa e o outro, russa. Seriam essas as especialidades tanto da orquestra
quanto do senhor?
Este grupo se mostra bastante à vontade no repertório
francês, tem sido a base do trabalho deles há muito tempo. Mas, claro, estamos
falando de obras que não são só importantes para a França. O concerto de Ravel
está entre os mais belos já escritos, assim como não dá para falar do
repertório sinfônico sem levar em consideração a Fantástica de Berlioz. Mas não
quis sugerir a ideia de ser esta a única música que eles sabem tocar bem, daí a
combinação de Liszt com Mussorgsky no segundo programa. Parte do meu trabalho
em Toulouse é justamente apostar na ampliação do repertório.
Além do posto em Toulouse, o senhor assume em setembro a
Sinfônica Alemã de Berlim. Qual é hoje a função do regente titular ou diretor
artístico? Como ela se modificou nos últimos 50 anos?
A principal função sempre foi e continuará sendo desenvolver
a sonoridade da orquestra, processo que nunca pode ser interrompido. E isso se
faz trabalhando o som e o repertório. Mas algo mudou nas últimas décadas: a
relação da orquestra, do maestro, com o público. Na Europa, as plateias estão
envelhecendo e é preciso ter em mente que sua função como regente não pode se
limitar a fazer música. É preciso atrair um novo público, assumir o papel de
mediador entre a música clássica e as pessoas. E isso se faz apostando em
concertos didáticos que mostrem ao jovem que esse universo também é dele, que
há algo aqui com que ele também pode se relacionar. É o que tenho feito na
França, é o que vou fazer em Berlim.
O senhor começou na música pelo piano. Em que momento
decidiu se dedicar à regência?
Comecei a estudar piano aos 7, mas na adolescência o contato
com a orquestra mexeu muito comigo. Enquanto ouvia aquele som maravilhoso, me
dava conta de que um instrumento era pouco. Ali soube que meu futuro seria como
maestro.
O senhor estudou com professores lendários: Anatoly Briskin,
Ilya Musin e Yuri Temirkanov. Que lição que guarda deles?
Tive sorte de conhecer pessoas tão especiais tão cedo em
minha vida. Ainda que fossem músicos diferentes, havia algo em comum em todos,
que me marcou bastante: a importância de se dedicar a todo instante ao
aperfeiçoamento da técnica e da interpretação, assumindo compromisso com a
música. E também vi neles uma combinação rara entre a humildade que se deve ter
perante a obra a ser interpretada e a clara percepção do poder que se tem em
mãos ao reger uma orquestra.
A ópera sempre fez parte de sua vida. Este repertório foi
acidental?
É curioso: a ópera apareceu na minha vida quando me mudei
para São Petersburgo. Antes, meu interesse era só sinfônico. Lá, comecei a
acompanhar os ensaios de Valery Gergiev no Teatro Mariinsky. E não só me
apaixonei pela ópera, pelo trabalho com os cantores, como me dei conta da
importância, mesmo para uma orquestra que não esteja vinculada a um teatro
lírico, de fazer óperas, linguagem que ajuda no desenvolvimento da sonoridade
de qualquer conjunto.
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