Lasar Segall
Esse classicismo aqui evocado, além dos princípios de clareza, equilíbrio e construção, acresce-se de outro. Segall possui uma característica fundamental própria à tradição das artes greco-itálicas: o corpo é o essencial, e o essencial é o corpo. A paisagem, quando existe, é acessória.
O artista explora a luminosidade da página branca, traçando
sobre elas sinais que designam o sofrimento de mulheres e homens.
Vejamos a primeira folha, que contém as duas datas. Os
algarismos, à direita, são grandes, bem desenhados (foram inicialmente traçados
a lápis), num tom de vermelho nada vivo, nada sanguíneo.É antes terracota, o que põe esses números em sintonia com o fundo da figura lateral, uma parede avermelhada em forma de trapézio, à esquerda. Sobre ela, uma figura feminina suspensa, com os braços amarrados no alto, os seios expostos, a expressão dolorosa.
VIOLÊNCIA
Parece-me que a violência tremenda criada por Segall nem é
descritiva, como a de Jacques Callot (Segall nunca foi um criador de espírito
realista), nem possui a genial teatralidade como a de Goya (1746-1828), nem
inventa um mundo fantasmagórico, como o de Dix. É fruto de uma exasperação
contraditória.As poderosas forças construtoras do artista, a organização arquitetural das composições acirram-se em contraste com as tensões criadas pela evidência maior de cada efeito. O artista não trabalha por impulso sem controle.
Graças às intenções perfeitamente dominadas, os cabelos em desordem, a face dolorosa, os seios caídos da mulher torturada dessa primeira imagem impõem-se com evidência. Surgem com força significante infinitamente maior do que se dissolvidos num conjunto criado por pulsões numerosas e sem cálculo.
Segall concentra, economiza, constrói: com isso, cria uma relação direta, única, singular, com o que representa, e ao mesmo tempo dilata sua concepção, tornando-a universal.
JORGE COLI
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