Muito
antes da mágica dos irmãos Lumière em 1895,
o significado e a
função
do que viria a ser a música do cinema já estavam nas obras de música
programática,
dramas musicados e nas óperas. O cinema é também uma forma de
projeção
em tela do teatro e seria acompanhado musicalmente de forma brilhante,
a
dar variados significados às inúmeras ações, cenas e personagens. Mesmo antes
do
cinema contar histórias, a música passou a fazer parte do cinema mudo. Em
geral
eram mesmo os pianistas ou organistas improvisando sobre as imagens,
quando
não se utilizavam de temas já conhecidos, para acentuar-lhes o espírito, o
clima,
a emoção. O início da música no cinema foi marcado pela utilização de
inúmeras
obras consagradas de compositores tais como: R.Wagner, E.Grieg,
L.V.Beethoven,
R.Schumann, G.Verdi, G.Bizet, F.Liszt, entre tantos outros. Desse
modo
era realizada uma associação psicológica a determinadas obras e a scripts de
certas
óperas. A atenção acabava por desviar-se da história do filme relacionando-o
com
os temas dos dramas musicais ou de música programática, como é o caso de
Romeu
e Julieta de P.I. Tchaikovsky. David W.Grifith (1875-1948), foi pioneiro não
apenas
nas imagens, mas também no uso da música. No seu primeiro longametragem: Birth
of Nation (O Nascimento de uma Nação, 1915), recorreu às obras
de
L.V.Beethoven, R.Wagner e P.I. Tchaikovsky, o que seria repetido em
Intolerance
(1916). Tanto sucesso fizeram seus dois filmes e respectivos scores,
que
estes logo seriam imitados, ou pela utilização
de música original ou pela
adaptação
de temas a situações específicas.
A
sonoridade do Recôncavo
Enquanto isso no Brasil de todos os santos
seria possível encontrar
evidências
sobre a musicalidade em diversas circunstâncias históricas no
Recôncavo,
região que entraria no século XXI como protagonista de uma nova
proposta
audiovisual com o surgimento de uma universidade e um curso específico
de
cinema na região. As sonoridades do Recôncavo seriam reveladas através da
oralidade
e registros da memória com uma fusão entre os ritmos afro-brasileiros
com
a teoria tradicional secular européia da música, criando uma sonoridade
multiétnica,
especialmente a partir da formação do
primeiro grupo organizado: a Sociedade Filarmônica Erato Nazarena, em
1863. É nesta efervescência
multicultural
que nasce o exímio clarinetista, maestro e compositor Manoel
Tranquilino
Bastos (1850-1935). Sua produção musical ao lado de outras tantas
de Heráclio Guerreiro e
Antonio Manoel do Espírito Santo – igualmente
maestros
de filarmônicas do Recôncavo – era tão rebuscada quanto a feita na
Europa
durante este período. Podemos atestar isto através da notícia dos prêmios
recebidos
por Bastos e Guerreiro na Alemanha. Em 1870, Bastos cria a Lyra
Ceciliana
– uma das 130 filarmônicas do Estado e uma das mais antigas. Além de
músico,
o maestro Tranquilino Bastos colaborava com diversos jornais da cidade de
Cachoeira
naquela época e destacou-se como um grande defensor da abolição da
escravatura.
É possível encontrar na obra musical deste compositor afrodescendente, centenas
de dobrados, marchas, frevos, polcas, valsas, música sacra,
árias
para canto e hinos. Este acervo foi adquirido há trinta anos pelo Governo do
Estado
da Bahia encontrando-se hoje disponível para pesquisas no setor de obras
raras
da Biblioteca Central. Ficou marcada na história de Cachoeira a passeata
musical
conduzida por ele em 13 de maio de 1888 que reuniu milhares de pessoas,
em
sua maioria negros recém libertos, em comemoração a assinatura da Lei Áurea
pela
Princesa Isabel.
Presente
e futuro
Neste cenário de grande tradição sonora e
riqueza cultural, não seria
possível
deixar de se conectar o som à imagem (o que já vinha sendo feito de certa
maneira
desde o surgimento do cinema com os irmãos
Lumière e posteriores
desenvolvimentos).
De modo muito particular, o cinema e o audiovisual em
Cachoeira
deu um grande passo para que se possa conquistar novos espaços e
desenvolver
uma intelligentsia sonoro-visual em
níveis nacional e internacional,
através
da primeira escola pública de cinema da Bahia no âmbito do curso oferecido
pela
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). Com a implementação
deste
novo núcleo audiovisual, variados estímulos serão proporcionados para que o
Recôncavo
possa seguir o seu destino cinematográfico. Esta região do nordeste
brasileiro
é utilizada como pólo de produção de cinema há 40 anos. Centenas de
documentários,
novelas, filmes de média e curta metragem, bem como produções
nacionais
e internacionais de filmes publicitários
já foram produzidos. Podemos
concluir
que o audiovisual é há muito tempo, forte parceiro do Recôncavo.
Espera-se
que a esta iniciativa possam ser agregadas outras de grande
relevância
para a região, e que o Brasil possa se orgulhar de tantos outros Glauberes que
com toda a certeza surgirão, frutos de um meio e condições
propícias.
Isto certamente proporcionará novas perspectivas e possibilidades para
um
maior desenvolvimento do cinema e do audiovisual no Brasil.
Andersen Viana*
Nenhum comentário:
Postar um comentário