Nascido
no Rio de Janeiro, a 15 de Dezembro de 1907, estava perto de celebrar os 105
anos.
O
arquitecto brasileiro Oscar Niemeyer morreu aos 104 anos, num hospital do Rio
de Janeiro. Tinha sido internado no início do mês passado, pela terceira vez
este ano. Desde então, o estado clínico tinha vindo a agravar-se, com problemas
respiratórios e renais.
Nascido
no Rio de Janeiro, a 15 de Dezembro de 1907, estava perto de celebrar os 105
anos. Teve cinco irmãos e a sua mãe morreu de cancro, ainda nova. Sobreviveu à
sua única filha Anna Maria morta em Junho passado. Visitei-o uma última vez, em
Março de 2011. Andava entusiasmado com a criação de uma nova Escola Popular que
teria o seu nome. Com o humor que todos lhe reconheciam, recordou a construção
de Brasília e a sua aversão por viagens de avião. Frequentou o escritório da
Av. Atlântica, em Copacabana, até quase ao fim.
Oriundo
de uma família carioca, conservadora e católica, com descendentes germânicos
que acompanharam a corte portuguesa, em 1807, na sua mudança para o Rio de
Janeiro, Niemeyer viveu uma juventude despreocupada e protegida por uma prima
solteira. Estudaria arquitectura por convicção ainda que só tardiamente. No
terceiro ano, já casado com Annita Balbo, ofereceu-se para trabalhar
gratuitamente no escritório de Lúcio Costa e Carlos Leão.
Com
Lúcio Costa, cinco anos mais velho, inicia-se na leitura das ideias de Le
Corbusier, com quem teria a possibilidade de colaborar logo em 1936, no
projecto para o Ministério da Educação e Saúde, no Rio. O edifício seria o
resultado de uma equipa montada por Costa, tendo Le Corbusier como consultor. Niemeyer
teria grande responsabilidade no desenho final, influenciando a posição do
bloco principal no quarteirão, ou determinando a direcção horizontal dos
“quebra-sóis”. Em 1939, também em uma parceria com Costa, projectou o pavilhão
do Brasil para a Feira Internacional de Nova Iorque, abeirando-se já de uma
espacialidade gestual, concretizada no desenho da rampa e na permeabilidade do
volume, características que assinalariam a sua primeira grande ruptura com o
racionalismo internacional.
O
melhor, portanto, insinuava-se: “Minha arquitectura começou depois na
Pampulha”. Estava-se em plena segunda guerra na Europa e, a serviço de
Juscelino Kubitschek, futuro presidente do Brasil, construiria quatro
obras-primas à beira da lagoa da Pampulha, bairro residencial sofisticado na
periferia da capital mineira de Belo Horizonte. Aqui estreava-se na exploração
das capacidades plásticas que a nova técnica do betão armado possibilitava,
dotando os seus edifícios de uma forte conotação formal.
No
entanto, quando surgiu o desafio, também lançado por Kubitschek, já presidente,
para a construção dos principais edifícios públicos da nova capital do país
Brasília – inaugurada em Abril de 1960 – a arquitectura de Niemeyer ressente-se
desse “excesso” formalista, contraindo-se aparentemente. Os edifícios de
Brasília apresentam-se geometricamente mais regrados e definidos pela
estrutura, como é o caso do Palácio da Alvorada, logo de 1956, ou o conjunto da
Praça dos Três Poderes. Esta nova fase seria significativa para a evolução da arquitectura
brasileira, repercutindo-se no trabalho das gerações mais recentes.
A
colaboração estreita que manteve com os engenheiros de estruturas transformaria
a sua arquitectura num ensaio de risco permanente. Essa confiança haveria de se
manifestar nas obras construídas no exílio, cumprido em plena ditadura militar.
Na Argélia, recentemente independente, mais exactamente no campus da
universidade de Constantine, cumpriu um dos seus programas arquitectónicos mais
arriscados, levando a técnica do betão armado a um limite aparentemente
insustentável. Contra o conselho dos engenheiros franceses que propuseram que a
grande viga longitudinal, que compunha a fachada, possuísse um metro e meio de
espessura, adoptou a solução de uma viga de apenas 30 cm.
Niemeyer
deixou obra significativa fora do seu país, chegando mesmo a construir, com
Alfredo Viana de Lima, em Portugal, o Hotel Casino do Funchal, a meio da década
de 60, hoje bastante desvirtuado. Foi protegido por figuras como André Malraux,
em França, ou Giorgio Mondadori, que em 1968 lhe encomendou a sede da sua
editora, nas proximidades de Milão. Tornou-se o maior embaixador da
arquitectura brasileira. Isto todavia é pouco, se comparado com o contributo
que deu à evolução da arquitectura moderna. Muitos dos seus edifícios
tornaram-se arquétipos para os arquitectos contemporâneos. Niemeyer foi um
génio e como tal, padeceu de violentos ataques e também de elogios
condescendentes. Talvez por ter medo da morte, foi aquilo que podemos descrever
como um “homem feliz”.
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