O Theatro São Pedro / SP abriu sua temporada de óperas na
noite do dia 26 de junho com um título querido pelo público. L'Elisir D'Amore é
uma das óperas mais conhecidas de Donizetti. Nela temos cenas cômicas, belas
árias e duetos e um amor inocente que nos dias atuais seria considerado até
bobo. L'Elisir D'Amore contagia com sua bela música e é encenada há quase duzentos anos. Grandes
sopranos e tenores atuais e da antiga já cantaram a alegria e as mazelas de
Nemorino e Adina.
A opção do diretor Walter Neiva de trazer o enredo para a
década de 40 do século XX era um risco eminente. Grandes diretores já se
atrapalharam transportando a ação para épocas diferentes do libreto. Walter
Neiva consegue , com maestria , e sem inventar moda modernizar a ópera,
transportá-la para a década de 40 e ser fiel ao libreto. Não inventa moda, não
faz firulas e não quer aparecer mais que os outros. Idéias criativas e
inteligentes fazem parte de toda a apresentação, suas marcações são corretas, a
movimentação dos cantores e do coro realça o cômico . Arranca muitos risos da
platéia, diverte e emociona ao mesmo tempo.
O cenário é de uma
beleza sem igual, digno de figurar em grandes teatros. O melhor cenário
apresentado pelo Theatro São Pedro nos últimos anos. Os figurinos impecáveis e
a luz realçaram ainda mais a apresentação.
A escalação do
elenco foi um primor: vindo da frança tivemos Sébastien Guèze. O jovem tenor
tem uma voz com timbre interessante, pequena e adequada ao personagem. Exagera
nas caretas ao cantar , mas atua com emoção. Esse é um detalhe que não pode
escapar, sua atuação junto com sua voz emociona o público. Os conhecedores de
ópera podem reclamar de sua técnica,
dizer que sua tessitura , seu legatto e sua extensão não são das melhores, eu
concordo com eles. Mas o jovem tem a capacidade de ser um grande Nemorino, pela
atuação cênica e pela superlativa capacidade de emocionar o público. Isso é
mais que suficiente para um grande Nemorino.
Gabriella Pace
arrasou como Adina, sua voz esteve maravilhosa. Lírica , jovial e sedutora. Sua
atuação cênica impecável mostrou sentimentos de desprezo e paixão quando o
libreto exigia. Mostrou grandes qualidades vocais do início ao fim da récita,
tudo adequado a personagem. Grande soprano, grande atuação vocal que arrepia a
cada nota.
Sebastião Teixeira
fez um Sargento Belcore engraçado e
interessante. Sua voz de barítono tem belos graves e agudos consistentes. Sua
atuação cênica mostra todas as trapalhadas e ansiedades do militar que deseja
casar o mais rápido possível com Adina.
Sua patente é de sargento , mas seu uniforme mostra medalhas e condecorações de
general, tudo hilário. Bravo Teixeira!
Outro que
arrebentou foi Saulo Javan, como Dulcamara foi o mais charlatão dos charlatões.
Sua voz tem graves maduros , consegue uma agilidade incrível para um baixo. Voz
possante , madura e arrepiante. Atuação soberba, quase derruba o cenário na sua
saída do palco com a bicicleta. Excelente Dulcamara.
O programa cedido ao
público saiu da mesmice e mostrou informações apresentadas de maneira inusitada
e criativa. Dar bem casado , com o nome de Adina e Nemorino , ao público na
saída do espetáculo é outra idéia interessante que agrada a todos. Espero que
essa produção não se perca e que seja apresentada no decorrer dos próximos
anos. A Orquestra do Theatro São Pedro manteve grande qualidade: tempos ,
volume e sonoridade compatíveis com a ópera de Donizetti. Nas mãos do maestro
Emiliano Patarra rendeu apresentou uma sonoridade digna de um grande Donizetti.
O coro esteve brilhante, nas suas intervenções mostrou grandes qualidades
vocais e ritmos que combinam com a obra.
Dia de estréia
(geralmente escrevo estréia com acento, a reforma ortográfica que vá às favas)
é peculiar, estão presentes cantores , diretores e muitos que escrevem e trabalham no meio.
Uma presença em especial me chama a atenção, o diretor do Theatro Municipal de
São Paulo , Abel Rocha. Ele assistiu a récita e espero que se inspire em fazer
óperas com essa qualidade. Contratar Walter Neiva é uma grande solução. Depois
do Rigoletto de 2011 e da La Traviata desse ano a coisa anda meio complicada
por lá.
Ali Hassan Ayache
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