quinta-feira, 30 de junho de 2011

CARTA ABERTA AO SR. ELEAZAR DE CARVALHO FILHO

Fui informado por terceiros que na programação anunciada pela direção da FOSB está ainda incluída uma obra minha, a ABERTURA FESTIVA, apesar de publicamente eu já ter me manifestado em carta ao Roberto Minczuk, proibindo a execução de qualquer obra minha pela orquestra que vocês estão criando em substituição à verdadeira Orquestra Sinfônica Brasileira que aprendi a respeitar e amar ao longo de mais de três décadas.
Não visito o site da FOSB e considero-me ofendido pelo fato de minha decisão não ter sido levada a sério pelos atuais dirigentes da Fundação.
Caro Eleazar de Carvalho Filho, eu confesso sentir-me em situação estranha, ao escrever este nome, que imediatamente me leva a evocar a figura do meu grande amigo, o seu pai Eleazar de Carvalho, maestro dos maestros brasileiros e cuja memória evoco aqui como exemplo. Como regente da Orquestra Sinfônica Brasileira, este grande maestro, seu pai, nem sempre encontrou flores e afagos. O exercício da regência de uma orquestra é às vezes duro, penoso e estafante, como me confidenciou um dia o seu pai, quando juntos éramos professores (ele de regência, eu de composição) na célebre Yale University nos Estados Unidos. Mas jamais, digo bem, jamais, o grande, grandíssimo Eleazar de Carvalho deixou-se levar por rancores, ódios, mágoas e disputas a ponto de demitir sumariamente os músicos de sua orquestra. E veja bem, com seu nome e renome, sua autoridade única e indiscutível que possuía na época ele possivelmente poderia fazê-lo sem maiores dissabores.
Quando chegou a ocasião de um possível confronto com seus músicos, o seu pai, o nosso Eleazar, o maior regente brasileiro de todos os tempos, teve a humildade, a sabedoria e a sensatez de sair de cabeça erguida e jamais promover uma guerra fraticida, uma vingança pessoal. Ele olhava mais longe, não só para sua carreira mas a própria sobrevivência de uma marca sagrada, a marca “Orquestra Sinfônica Brasileira”. Se seu pai já era grande, enorme, artistica e humanamente, ele então tornou-se então um gigante, um sábio, um iluminado. E a partir daí, a partir de sua saída da OSB, sua magistral carreira atingiria degraus a que nenhum regente brasileiro ainda alcançou até hoje, nos Estados Unidos e Na Europa.
Vejo então com tristeza, confesso-lhe, Eleazar Filho, pois tal como o Roberto eu o conheci um menino ainda, nos braços de sua mãe, a compositora Jocy de Oliveira, minha colega. Vi você, Eleazar Filho, galgar adulto os mais altos postos da administração financeira do nosso país, em especial no BNDES, onde com justiça favoreceu tantos eventos musicais, movido pelo amor pela música que seguramente lhe passaram seu pai, Eleazar e sua mãe, Jocy.
Hoje vejo você e o Roberto, aqueles dois meninos que eu conheci em minha juventude, desprezarem a grande lição daquele que deveria ser o exemplo, o mito de ambos, como pai e grande maestro.
Ao contrário e na contramão desta filiação, você, Eleazar filho, promove junto com o Roberto, a mais impressionante desagregação do meio musical de que se tem notícia na história do nosso país. Não entendo, não consigo compreender por mais que faça o maior esforço, como vocês dois, Eleazar e Roberto, não conseguem enxergar que estão promovendo uma das maiores violências contra a própria instituição que lhes foi entregue para preservar e levar à frente. A ironia é gritante ao ler no seu próprio nome, Eleazar de Carvalho Filho, a presença de uma herança moral, musical e artística que todos desejaríamos ver preservada.
O que há de mais sério no meio musical do Rio de Janeiro,do Brasil, da Europa, dos Estados Unidos, os jovens músicos e os mais velhos, os maiores nomes da música do Brasil e do exterior estão perplexos diante de um fato absolutamente inédito: vocês dois, Roberto e Eleazar, continuam impávidos, ignoram a tudo e a todos, não ouvem as vozes de fora de si mesmos, e, me pergunto: será que ouvem as vozes interiores, as vozes profundas de suas consciências? O Brasil musical está sim, não tenham qualquer resquício de dúvida, em grave perigo, não somente pelas demissões de 30,40 músicos e do desamparo de suas famílias, a perplexidade de seus filhos e também netos. Mas pelos seus jovens, que não podem, não devem ser confrontados e desestimulados logo no início de suas vidas. Sim, a juventude musical do Brasil, Eleazar e Roberto, como vocês pensam que está reagindo a tudo isso?
Vimos já a atitude corajosa, incrivelmente ardente daqueles moços da Orquestra Jovem da OSB se levantarem não para lhe agredir, Roberto, mas para protestar surda e silenciosamente, negando-se a tocar sob pura e explícita coação.
Quem pode, meu Deus, fazer música, pensar música, debaixo de coação,de desencanto, de desesperança, seja ela qual for?
Onde estamos, meu Deus, em que país, em que território, em que cultura, em que lugar, em que deserto cultural estamos, expostos à situação mais deprimente frente às organizações internacionais que repudiam, diretamente este tristemente famoso “caso brasileiro”?
Não devemos, não queremos, não podemos ser explicitamente famosos por tal situação clamorosamente negativa, lamentavelmente gritante, levada a tal ponto que simplesmente ninguém pode prever seu desfecho. O que se sabe, o que se sente é que bom, ele não será para ninguém mais.
E agora, mais uma falta de respeito e esta de cunho exclusivamente pessoal: após minha carta aberta a você, Roberto, publicada em todos os cantos, blogs e jornais do Brasil e do mundo, a FOSB, sem minha autorização, ainda inclui em sua programação anunciada agora, uma peça de minha autoria, apesar de minha expressa proibição! Isto, tenho este direito, parece-me uma lamentável afronta pessoal.
Ora, alguns músicos premidos por razões que não me cabe imaginar nem especular, venderam suas almas ao diabo depois de terem publicamente execrado as demissões e a situação e a direção atual da FOSB, esquecendo que eles próprios são e serão os próprios algozes.
Pois eu, Marlos Nobre, lhes peço: não me confundam com eles, desertores de uma guerra santa, por favor ao menos respeitem-me para serem respeitados no mínimo que ainda resta de respeito em toda esta maratona de erros e de lamentável situação à qual está exposta a GRANDE MÚSICA DO BRASIL


MARLOS NOBRE
Rio de Janeiro, 28 de junho de 2011

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